Frei Rufin (primeira página)

A Agnès de Prague (4)

 1 Àquela que é a metade da minha alma e escrínio singular da minha afeição, à ilustre rainha e senhora Inês, esposa do Rei eterno, sua mãe caríssima e filha entre todas preferida, 2 Clara, indigna serva de Cristo e inútil servidora das servas que vivem no mosteiro de São Damião, 3 deseja saúde e a ventura de poder cantar com as demais virgens o cântico novo diante do trono de Deus e do Cordeiro e de seguir o Cordeiro para onde quer que vá.

4 Não te cause estranheza, querida mãe e filha, esposa do Rei de todos os séculos, que eu não tenha escrito tantas vezes quantas o deseja o coração. 5 E não penses, sobretudo, que por isso o fogo de amor por ti esmoreceu no coração de tua mãe. 6 O pro-blema é a falta de mensageiros e os enormes perigos dos caminhos. 7 Nesta ocasião em que me é possível escrever, alegro-me e exulto no Espírito Santo, 8 porque, tal como a outra virgem, Santa Inês, desposaste o Cordeiro de Deus que tira os pecados do mundo, depois de renunciares a todas as vaidades mundanas.

9 Feliz daquela a quem foi
dado gozar desta íntima união,
e que aderiu com todas as fibras do seu coração

10 Àquele cuja beleza
é contemplada por todos os santos do exército celeste,

11 cujo amor nos encanta,
cuja contemplação nos vivifica,
cuja bondade e benignidade nos basta.

12 A sua doçura satisfaz-nos plenamente e a sua recordação ilumina-nos com suavidade.

13 O seu odor ressuscita os mortos,
e a sua visão beatífica
santifica os habitantes da Jerusalém celeste.

14 Ele é o esplendor da eterna glória,
a luz da eterna luz,
o espelho sem mancha.

15 Contempla diariamente este espelho, ó rainha e esposa de Jesus Cristo. 16 Observa nele o teu rosto para que a grande varie-dade de virtudes 17 que embeleza o teu interior e exterior, seja como manto de flores, tal como convém à filha e esposa do Rei supremo. 18 Neste espelho poderás contemplar, com a graça de Deus, como resplandece a bem-aventurada pobreza, a santa humil-dade e a inefável caridade.

19 Contempla, no princípio deste espelho, a pobreza, pois está colocado no presépio e envolto em paninhos. 20 Oh maravilhosa humildade! Oh admirável pobreza! 21 O Rei dos anjos, o Senhor do Céu e da terra reclinado num presépio!

22 Ao centro deste espelho considera a humildade e a santa pobre-za. Quantas tribulações e sofrimentos não suportou para resgatar o género humano! 23 E no fim deste espelho contempla a inefável caridade que O fez sofrer no patíbulo da Cruz a morte mais infame.

24 Suspenso da árvore da Cruz, este espelho adverte os transeuntes:

25 “Vós que passais, contemplai e vede se há dor semelhante à minha”. 26 Respondamos com uma só voz e um só espírito a este grito de dor: “A pensar nisto sem cessar, minha alma desfalece dentro de mim”. 27 Desta maneira o teu coração se inflame duma caridade cada vez mais forte, ó rainha do Rei celeste.

28 Contempla, além disso, as inefáveis delícias, as suas eternas riquezas e honras 29 e exclama suspirando, plena de anseios e com profundo amor:

30 Atrai-me a Ti
e correrei ao odor dos teus perfumes,
ó celeste Esposo.

31 Correrei sem desfalecer,
até que me introduzas na sala do festim,

32 até que a minha cabeça
repouse sobre a tua mão esquerda, e a tua direita me abrace com ternura
e me beijes com o ósculo suavíssimo da tua boca

33 Nesta contemplação não esqueças a tua pobre mãe.

34 Tenho-te presente no meu coração, duma maneira muito espe-cial, como a mais querida de todas. 35 Que mais dizer? Que faça silêncio a linguagem da carne e dê lugar à do espírito acerca da minha afeição por ti, filha bendita. A linguagem dos sentidos só muito imperfeitamente pode manifestar o amor que sinto por ti.

36 Sê, pois, benevolente e aceita com humildade esta expressão de afeição maternal. 37 Todos os dias penso em ti e tuas filhas, às quais me recomendo, juntamente com minhas irmãs. 38 Da mesma maneira as minhas filhas e especialmente a virgem prudentíssima Inês, minha irmã, se recomendam tanto quanto podem a ti e às tuas filhas em Cristo.

39 Saudações para ti, filha caríssima e para tuas filhas. Adeus, até à glória do trono do grande Deus. Rezai por nós.

40 Recomendo à tua caridade, duma maneira especial, os
portadores desta carta, Frei Amado, querido de Deus e dos homens e Frei Bonagura

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Realizado por www.pbdi.fr Ilustrado por Laurent Bidot Tradução : Nathalie Tomaz